segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Ela é de humanas

Quando estava no final do colégio e me encontrei no famoso dilema de escolher qual faculdade eu vou fazer, descartei de cara uma gama de opções com o seguinte pensamento "Não manjo física e matemática, nada de "Exatas" não quero morrer de estresse e ódio pela raça humana, nada de "Humanas". Simples assim.

Quem me conhecia na época apostava que eu ia fazer alguma coisa entre ciências sociais, letras ou história, mas não rolou. Minha experiência com as ciências humanas no colégio teve grande influência nesta decisão, eu poderia resumir três anos de estudos "Humanos" em uma palavra: decepção.

Sim, porque apesar de não gostar de Exatas quando eu me esforçava e tentava manter as linhas de raciocínio 2 ao quadrado era sempre 4 e sob as CNTP os gases têm comportamento previsível. A matemática não te decepciona, ela não vai te deixar frustrada, você pode frustrar-se consigo mesma por tirar dois na prova de vetores, mas a física tá lá, intocada (pelo menos nos níveis de conhecimento que tive a honra de ser apresentada). Já as Ciências Humanas... Ah!

Decepção é uma expressão forte, mas ao mesmo tempo parece não exprimir tudo. Porém, o que esperar de estudos que têm como ponto central o ser humano e suas atitudes? Somos um monte de merda fazendo sujeira e fedor por aí.

Escolhi farmácia, fiquei no muro entre a biologia e a química, a mais experimental das "ciências exatas", muita gente achou que não ia durar, mas cá estou eu comemorando um ano e meio de formada. Uhu!
Ah! An...

Fui pro lado da ciência experimental, protegida dentro de um laboratório e outro da espécie humana, de seus estudos e de suas decepções. Fiz uma escolha, preferi estudar como salvar o corpo fisiologicamente falando de um ser humano do que entender suas misérias, cada uma sabe de seus próprios limites. Escolhi não me envolver. Estou em paz, certo?

Hum, o que tenho a lhe dizer é que a vida é uma caixinha de surpresas completamente irônica.

Não fiz letras, porém continuo lendo e indo cada vez mais fundo no mundo da literatura. Não sou uma leitora que preza quantidade, mas a qualidade tem me guiado bravamente.

Não fiz história nem geografia, mas tenho viajado e aprendido os podres e as glórias de diferentes povos, suas desgraças e assunções são lindas de se ver e ouvir, principalmente banhado a cerveja.

Não fui cursar nenhuma ciência social, psicologia ou licenciatura, mas aprendi e aprendo todo dia com os outros espécimes iguais a mim o quanto somos limitados e devemos aprender com esses limites.

Tentei fugir de ser humana, mas a humanidade que buscava evitar esteve sempre dentro de mim. Como posso fechar os olhos e dizer "feminismo é mimimi" ao abrir a caixa de entrada e ver uma mensagem da minha prima dizendo que está na delegacia porque um "malandrão" não aceitou o não que ela e a amiga deram e avançou o sinal, assedio sem abuso físico é crime sim! Ou quando toda vez que vamos ao bar e meu namorado pede as bebidas eu tenho que trocar os copos porque a cerveja é pra mim e o Martini é pra ele.

Como posso ser neutra ao ver meu próprio irmão sofrendo discriminação no trabalho e na faculdade porque "homem trans não é homem, é mulher com transtorno mental". VSF!

Como posso ser omissa se ao sair com um colega do trabalho pra beber uma cerveja e ouvir uma música a gente não pode pegar o metrô sem que algum grupinho faça piadinha e risadinhas soltando de vez em quando um "viado!".

Dá pra ser passiva de opinião quando seu pai luta por uma licença saúde remunerada por conta da igreja na qual trabalhou mais de vinte anos, tem que além de provar que está doente, abrir sua vida pessoal e circunstâncias simplesmente porque não é um câncer, que acomete qualquer um... Não, é HIV, e só pessoas devassas têm HIV, pessoas idôneas, como um pastor deveria ser, não pegam essas coisas.

Tentei não me envolver porque sabia que não conseguiria fazer pela metade e sair ilesa... Mas como é que eu vou fugir das ciências humanas quando eu sou a própria humanidade?

2 comentários:

  1. Verdade, viu. Senti um tom de desabafo, mas cada um dá à literatura, por exemplo, o rumo que prefere. Eu escolhi trabalhar e me deliciar com ela e vc ficou com a parte saborosa, apenas.
    Uma das poucas coisas que tenno certeza na vida é a de que eu sou de humanas, rs.

    Beijoks

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  2. e quem não for, bom sujeito não é.

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